sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Uma carta da ovelhinha que não foi domesticada;

 (Trilha sonora - Passenger Seat DCFC)

                                                                   Queridos avós,

                 Lá estava eu, a garotinha de oito anos, com cabelos cortados na altura do ombro e um sorrisinho amarelo, desses que mostram visivelmente nossa insatisfação. Lá estava eu, encarando o sapato novo enquanto tentava me livrar do calor, abanando de um lado p'ro outro o folheto cheio de escrituras bíblicas que haviam me dado. Eu sei que deveria estar prestando atenção no que o padre falava, mas eu não gostava dele. Ele falava demais e eu nem conseguia acompanhar. Às vezes, só às vezes mesmo, dava pra entender algumas frases, que no fim das costas, era incompreensível de qualquer forma. Eu ficava ali pensando, pensando: "Porque Deus quer que eu fiquei aqui ouvindo isso?", "Porque eu preciso levantar e sentar só na hora que todo mundo o faz?", mas caramba! Sinto as pernas inquietas, não quero ficar ali sentada, não quero, não quero... Só que Deus castiga. Falaram que ele castiga se você não vai a Igreja e se não presta atenção na missa. Bom, Deus deveria ser um cara legal. E na minha cabecinha, ele era. Então, lá estava eu, fugindo da missa mais uma vez, com a desculpa de ir beber água nos bebedouros que ficavam no fundo da Igreja. Escapei quantas vezes? Todas que pude, e vocês, avôzinhos, achando que eu estava lá com meus pais, sendo uma boa cristã. Qual é? Eu sempre fui uma boa garotinha, não brigava na escola, fazia todos os meus deveres, respeitava a mamãe e o papai, e levava surra sozinha na maioria das brigas com meu irmão. Eu era uma boa garotinha, tirava notas boas, cresci, e em vez de ir atrás de namorados, ficava em casa estudando e brincando no computador e no playstation 2. Eu era uma boa garota, fui trabalhar e paguei a faculdade. Amei e me deixei ser amada, principalmente como ser humano. E posso apostar, que esteja Deus onde estiver, ele deve estar mais orgulhoso de mim do que vocês jamais estarão. Porque Deus não deve estar preso ao fato de quantas vezes eu fui a missa, mas, de quantas vezes eu fiz alguém sorrir, de quantas vezes tornei a vida de alguém mais fácil, de quantas deitei no travesseiro com a mente cheia de pensamentos bons e esperança, e da força que adquiri nos piores momentos. Deus é o melhor cara (você pode espernear por eu chama-lo assim, vó, mas eu e Ele temos intimidade suficiente pra isso) que eu conheço. E vô, já que você acha que missa é igual uma escola que a gente deve ir pra aprender sobre Deus e como amá-lo, espero que um dia você fique feliz em descobrir que eu não precisei decorar matéria e nem colar pra passar de ano, eu estava estudando em casa e aprendo com a vida, todos os dias.

                                                                                                            Com amor, Eu.



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