quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Nós fomos a qualquer lugar por você.


Dezembro, dia 10. Se perguntar em qual da semana, já é pedir demais. Lembro-me apenas de alguns detalhes daquela noite, outros, talvez tão importantes quanto, foram engolidos pelo nervosismo. Eu não consigo lembrar ao certo o que fiz durante a tarde, mas lembro que Danilo estava lá no final dela, se observando no espelho enquanto arrumava alguns fios de cabelo e eu passava lápis de olho. Não lembro quais canções ele colocou pra tocar durante o percurso até o Campus, mas talvez tenha tocado Darin, Imagine Dragons, John Martin, e todas as outras que intitulamos como "nossas". Talvez algumas lágrimas tenham até hesitado  cair pelo canto inferior dos olhos; lágrimas de medo, ansiedade, dor e alegria. 

O carro nos deixou em frente a portaria, mas o medo não foi embora. Medo de dar tudo errado. Medo de que as horas ensaiando na frente do espelho não valesse a pena. Era tanta coisa pra explicar e tanto medo pra tentar disfarçar. Mesmo assim estávamos tentando, sorrindo um pro outro e procurando Raíssa; Ela estava no corredor, atrás da escadaria do primeiro andar, gesticulando com os braços frenéticos, talvez tão ansiosa quanto nós dois. Apressadamente, pediu para que entrássemos na sala de edição enquanto buscava uma porção de coisas na cantina da Universidade. Entramos. Lá estava Olivia sentada, de crachá e blusinha, toda uniformizada. Ela parecia tão calma que chegou a me encher de inveja. Sei que ela era tímida, e talvez estivesse até mais preocupada do que nós, mas com certeza sabia como disfarçar; Ela entregou nossos crachás e camisetas, fomos no banheiro vestir, e quando voltamos, Raíssa já estava com ela, esperando para repassarmos toda a apresentação antes de subir e encarar a banca.

É incrível como esse negócio chamado TCC tem a capacidade de mexer com o nosso organismo. Se alguém conhece uma pessoa que não sofreu nesse dia, dê parabéns por mim, porque ela realmente sabe o que é ter auto-controle. Nós não tínhamos. Não naquele momento. As palavras ficando no ar e era apenas o ensaio. O vigésimo ensaio, por sinal. Cada parte do corpo em alarme, estômagos embrulhados, mãos frias, camisetas umedecendo dentro de uma sala com ar-condicionado ligado. Frases se formando sem a menor compreensão própria, parecendo maquininhas que jogavam tudo pra fora, em massa. Caramba! A gente sabia tudo e, de repente, parecia que não sabia nada. Parecia que um ano não era mais o suficiente. Ele ficava esmagado por aquele desespero de uma hora, no máximo.

Calma. Raíssa falou. Ela nunca estava calma, mas na cabeça dela, podia passar isso pra gente. Afinal, nós meio que a intitulamos como mãe do grupo. Foi ela quem gritou "porra, a gente consegue", no banheiro, quando fomos esculachados pela orientadora, logo no começo do ano. Foi ela quem escondeu as lágrimas quando não conseguimos entregar um dos capítulos a tempo, prometendo para si mesma que a gente ia fazer melhor no próximo. E agora, era ela que pegava nossas mãos e pedia uma última oração antes de subirmos por três andares, respirarmos fundo, e mostrarmos todo nosso talento.

Que assim seja.

E fomos, tentando não pensar, não olhar, não sentir. Tentando esquecer a pressão, a analise dos jurados, tentando esquecer o medo, e lembrando apenas que a gente passou por tanta coisa, nós fomos tão longe, foram tantos sábados saindo de nossas próprias cidades para nos reunirmos, exaustos de uma semana inteira cheia de trabalho mais faculdade. Foram tantas noites dentro da biblioteca, tentando não se distrair com um menino chamado Matheus que entrava na nossa cabine só pra rir com as piadas do Danilo. Foram tantas noites irritando as moças da biblioteca por sermos o último grupo a sair. Tantas tardes no telefone, desesperados pela falta de tempo. Tantas mensagens nos grupos online. Foram tantos finais de semana divididos entre tirar fotos, filmar, editar.

Foram tantos dias... Que pareciam infinitos, até que havia chegado o único pelo qual todos os outros existiram. Lá estava ele, perdido no meio de Dezembro, guardando a resposta para o nosso futuro. Nós fomos a qualquer lugar por aquele TCC. Nós nos descobrimos mais fortes e mais unidos; E enquanto apresentávamos nosso slide naquela noite, chegamos exatamente na fase final daquele jogo de quatro anos, cheio de fases complicadas e recompensas valiosas.

Não foi só o "vocês estão aprovados" que fizeram nossos olhos transbordarem em lágrimas. Foi parte de um todo muito maior; Choramos de alívio, sim. Mas também choramos por tantas outras coisas. Foi nessa hora que a ficha caiu completamente. Não existiria mais prova no final da noite nem exame no fim do semestre. Não existiria trabalhos para serem entregues as pressas e nem horas de espera no xérox. Não existiria mais.. Nós. Aquele era o momento final, o abraço de felicidade e gratidão, o choro de despedida ao grupo acadêmico que fomos. A amizade, com sorte, continuaria fora daquelas paredes, mas nunca seria a mesma coisa. Aquele TCC era nosso filho, e naquele breve instante em que a ficha caía, entendemos que nosso filho cresceu e tomou #asas, deixando a gente livre pra voar por outros caminhos também.





2 comentários:

Anônimo disse...

Muito inspirador esse texto, pois ele relata e traduz muitas histórias e sentimentos, me senti como um dos personagens, foi difícil ver meu filho ir, mas a sensação de gratidão e dever cumprido foi maior!

Hélio Consolaro disse...

Uma crônica com tema bem moderno, parabéns!